“É muito bom ser pago para jogar bola”: repórter do R7 participa de partida do Corinthians Master

No destaque, repórter que atuou pelo Corinthians

Sempre imaginei como seria ser pago para jogar futebol em time grande. Trabalhando com isso todos os dias, porém, esse pensamento acaba perdendo força com o tempo. Contudo, neste sábado (18), tive uma amostra do que pode ser vestir a camisa de um time de massa. A reportagem do R7 foi convidada pelo time de Masters do Corinthians para participar de um jogo. O repórter escalado para jogar fui eu (Maurício Duarte).

A partida foi contra um time de amigos do volante alvinegro Edu, no estádio do Flamengo de Guarulhos. O objetivo era arrecadar alimentos para um fundo social. A festa é tradicional na cidade, ocorre todo ano e faz parte das comemorações de seu aniversário. Portanto, um número considerável de torcedores compareceu às arquibancadas, principalmente corintianos. 

Craque Zenon lança bola de três dedos ao ataque

A equipe do Corinthians contou com os seguintes jogadores, de diferentes épocas do clube: Zenon, Dinei, Ezequiel, Biro-Biro, Guinei, Fabinho Fontes, Dama, Gino, João Paulo, Dagoberto, Nilson, Edson Pezinho, Chicão, Ataliba, Wagner Basilio, Carlinhos. Alguns foram grandes ídolos, outros tiveram passagens de pouca ou nenhuma identificação com o Timão. Estes encontraram um meio de se redimir através do Masters. 

 

O trajeto – Encontrei a equipe ainda no Parque São Jorge, de onde saímos de ônibus para o local do jogo, marcado para 16h (de Brasília). A quantidade de pessoas que paravam apenas para ver o veículo com o distintivo do clube passar já impressiona. Lá dentro, um clima de tranquilidade, vez ou outra interrompido por alguma piada do Dinei.

Embora o sentimento de nostalgia impere em cada conversa – falam sobre seu tempo de jogador, ou criticam alguns atuais: “no meu tempo não jogava” – a sensação é de que são amigos se reunindo para uma pelada seguida de churrasco e cerveja (isso nunca falta após uma partida do Masters). É o que diz o ex-atacante Dinei. 

– Sinto falta deste ambiente, da bagunça com o pessoal. Vai chegando o fim de semana e já vou ficando com vontade de estar aqui. 

Edu, que negocia com outros clubes para 2011, atuou pelo time adversário

Resolvo me aproximar para ouvir os responsáveis por tudo aquilo. Dois homens estão à frente do projeto: Wagninho e Zenon. O primeiro, além de organizador, é o técnico da equipe. Após trabalhar nas categorias de base do time, em 1997 decidiu assumir a tarefa de fazer o Corinthians forte também entre os veteranos. De acordo com ele, mesmo com a pouca ajuda do clube, eles conseguem viajar o país todo para jogar. 

– O clube ajuda com algum material, mas não dá para dizer que dá aquela força. Andamos com nossas próprias pernas. 

Zenon, que foi ídolo do clube na década de 80, durante a democracia corintiana, é o outro braço que ajuda a carregar a iniciativa. Questionado sobre o motivo de um ex-atleta bem-sucedido profissional e financeiramente passar os fins de semana viajando para jogar, o camisa 10 não titubeia. 

– Porque eu adoro estar neste meio. Não que eu sinta f

A lenda Biro Biro após atuação foi para o banco

alta do profissional. Mas agora eu posso simplesmente jogar com prazer, sem pressão, sem precisar dos três pontos. Faz um bem danado para a alma. É preciso resgatar esses ex-jogadores. Temos três gerações de atletas aqui. 

O Masters também cumpre um papel social que deveria ser do clube: olhar para seus ex-jogadores com mais carinho. De acordo com Wagninho, esses jogos acabam servindo como complemento de renda para muitos ex-atletas que passam dificuldades. O valor cobrado para uma apresentação do time é de R$ 5.000, que acabam divididos em cerca de 20 pessoas – no total, a equipe conta com 40 atletas, que se dividem nos jogos. 

Além disso, o contratante paga transporte e estadia, caso o compromisso seja fora de São Paulo. No final das contas, cada jogador fica com cerca de R$ 250 por partida. Como são feitos até quatro jogos por mês, quem vai a todos tira R$ 1.000. Isso é mais do que o salário que alguns deles recebem hoje em dia. Os que têm emprego. 

O jogo  – Chegando ao estádio, cerca de uma hora antes da partida, a movimentação da torcida já era grande. No vestiário, durante o aquecimento, fiz questão de participar de todos os rituais: a reza, a corrente e as palavras de incentivo. Tudo muito parecido com um time profissional, apenas um pouco menos barulhento. Ganhei a camisa número 34. 

Ao subir pelo túnel, já comecei a ouvir os fogos e o barulho da torcida. De fato, arrepia. Imaginei isso em uma proporção muito maior, como deveria ser no tempo em que esses caras ao meu lado estavam na ativa, e entendi perfeitamente o motivo pelo qual é tão difícil um jogador de futebol encarar a aposentadoria. 

Quando entramos no campo, vi que a festa era maior do que eu havia pensado. Até o prefeito da cidade estava presente. Teve locutor anunciando as escalações, times perfilados para o hino nacional brasileiro e da cidade de Guarulhos. Depois, entraram crianças de um projeto social em campo para cumprimentar os jogadores. 

Aí, então, a grande surpresa: vieram me pedir autógrafo – foi a primeira vez de umas quatro que ocorreram nesse dia, antes, durante e depois do jogo. Mesmo sem saber quem eu era, apenas por estar vestindo a camisa do clube. Com certo constrangimento, expliquei que não era jogador, mas não foi fácil convencer a molecada de que eu não era somente um “mala” que evita o público. Dinei, de longe o mais assediado, diz que isso é normal. Para ele, além de autógrafo, pedem a camisa 18, número com o qual conquistou os títulos brasileiros de 1998 e 1999 com o Timão. O treinador Wagninho complementa.

– Todo lugar que vamos é essa loucura. Não importa muito quem é. O que interessa é a camisa.

Como, obviamente, ninguém fazia a menor ideia de quem eu era, a torcida logo arrumou um jeito de simplificar e me deu um apelido: John Lennon (fica fácil deduzir o motivo olhando minha foto). Cada vez que eu pegava na bola, ouvia alguém gritar. Pelo menos não me chamaram de Mick Jagger, ou meu time fatalmente teria perdido. O vocalista dos Rolling Stones ficou com fama de pé-frio durante a Copa do Mundo da África do Sul. 

Meu desempenho foi razoável. Foram dois tempos de 35 minutos cada. Entrei faltando 15 para acabar o jogo e nosso time já vencia com facilidade, por 5 a 2. Joguei no ataque e consegui participar de alguns lances. Peguei na bola algumas vezes, acertei passes, fiz tabela. Na pior das hipóteses, rendeu um elogio do Ataliba, o que já não é pouca coisa. 

– Entrou bem, John Lennon. 

Depois da partida, me despedi de todos no vestiário e ainda fui convidado a voltar quando quisesse. No entanto, é bom não me deixar contaminar demais com um ambiente que não é meu. É preciso lembrar que minha função no futebol é do lado de cá das quatro linhas. 

Para quem gosta de futebol, esses 15 minutos entre jogadores que vimos só das arquibancadas valem mais do que uma hora. Receber um lançamento do Biro-Biro, ou fazer uma tabela com o Ezequiel, não são coisas fáceis de conseguir. E uma coisa ficará clara para sempre na minha cabeça de uma vez por todas: sim, é muito bom ser pago para jogar bola.

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