A pauta que será apresentada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nesta terça-feira durante a sua participação em reunião de cúpulas internacionais na Organização das Nações Unidas (ONU) – que consiste na transição energética no país -, é considerada defasada por especialistas.
O tema foi abordado primeiro pelo Metrópoles e trata de alguns dos principais aspectos que serão defendidos por Lula durante o seu discurso na ONU.
Na semana passada Lula enviou ao Congresso Nacional, o programa Combustível do Futuro, com metas para reduzir o uso de combustíveis fósseis e estimular a chamada economia verde. O objetivo na proposta é demonstrar que o Brasil está empenhado em adotar ações para frear as mudanças climáticas.
Lula tenta se distanciar de Bolsonaro (PL) ao tratar – mesmo que de forma rasa -, o compromisso com a preservação ambiental no país
Especialistas, no entanto, avaliam que há muito a ser feito para garantir que o discurso ambiental se traduza em ações eficazes. Ambientalistas ponderam que as propostas adotadas em território brasileiro ainda têm bases atrasadas e podem servir como “cortina de fumaça” para a manutenção da exploração de combustíveis fósseis por mais tempo.
Roberto Kishinami, coordenador sênior do portfólio de economia do Instituto Clima e Sociedade (ICS), considera que Lula tem dedicado atenção considerável à agenda climática. Contudo, ressalta que o governo ainda trabalha com temas considerados obsoletos, como é o caso dos veículos a combustão.
“Na verdade, só reforça uma coisa antiga, que vai ter que desaparecer. O biodiesel, por exemplo, não serve mais para uso, porque é degradável, e deveria ser substituído por eletrificação”, defende Kishinami.
O aumento do biodiesel no diesel para 15% até 2024 (estava previsto para 2026), por exemplo, integra o bloco de ações enviadas pelo Executivo ao Congresso, na última semana, como estratégias para tornar menos poluente a matriz energética do país.
Além disso, o governo propõe o aumento do ritmo de elevação do etanol na gasolina — dos atuais 27,5% para 30% — e a criação do Programa Nacional de Combustível Sustentável de Aviação (ProBioQAV), que prevê metas progressivas para, até 2037, reduzir em 10% as emissões de gases responsáveis pelo efeito estufa no setor aéreo. Esta medida será implementada mediante o aumento na mistura de combustível sustentável de aviação (SAF) ao querosene tradicionalmente usado.
Na ocasião do lançamento, Lula destacou que o projeto constitui mais um passo para a transição energética mundial. O mandatário pretende reforçar acordo feito durante o G20, com Estados Unidos e Índia, por uma Aliança Global de Biocombustíveis.
“Essa produção de biocombustíveis, nessa transição energética pela qual o mundo todo clama, é uma oportunidade para este país. Uma chance de transformar o Brasil em algo tão mais importante do que o Oriente Médio é para o mundo, com o petróleo. Podemos cumprir esse papel com os combustíveis renováveis”, disse o presidente.
Na visão de Kishinami, o programa do Executivo federal ainda deixa a desejar em pontos cruciais. Cabe ao governo colocar o trabalho interministerial em prática, e mostrar como o Brasil pode se desenvolver sem depender de combustíveis fósseis.
“O Combustível do Futuro deveria apontar para o futuro, não para o passado”, argumenta.
Com a agenda, o governo brasileiro quer ainda reduzir o tom das cobranças relacionadas à insistência na ideia de explorar novos poços de petróleo no litoral amazônico.
Logo após o lançamento do programa, o ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira, cobrou “celeridade” do Ibama na avaliação da revisão que a Petrobras pediu na decisão de vetar estudos sobre a viabilidade de exploração de petróleo na margem equatorial, litoral amazônico.
“Queremos fazer a transição energética, mas o povo brasileiro não pode pagar essa conta. O mundo, infelizmente, ainda é dependente de petróleo e gás, e a margem equatorial talvez seja a última fronteira de exploração para o Brasil”, disse Silveira, no Palácio do Planalto, na quinta-feira (14/9).
Transição energética
O conceito de transição energética consiste em uma mudança na forma de produção global. Nesse contexto, a atual matriz de produção de energia baseada em fontes não renováveis (como o petróleo e o carvão) seria substituída por fontes limpas e sustentáveis.
Essa transição implica diretamente as emissões de gases de efeito estufa, a diminuição da dependência de recursos finitos e a promoção da eficiência energética. Apesar disso, Marcelo Laterman, porta-voz do Greenpeace Brasil, salienta que o Brasil não explora todas as possibilidades para essa mudança, ao negligenciar ações mais inovadoras.
“O Brasil tem uma posição privilegiada, devido à riqueza dos recursos naturais necessários para essa transição – com alto potencial de radiação solar e regiões com ventos fortes e constantes. No entanto, todo esse potencial ainda é pouco explorado, e não da melhor forma, com as melhores práticas”, defende Marcelo Laterman.
A transição energética surge justamente como uma forma de garantir o desenvolvimento do país sem degradar o meio ambiente. No entanto, na prática, o governo ainda não se desvinculou de práticas de degradação e exploração de recursos fósseis.